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Opinião - Sargaço no Brasil: invasão de algas no litoral assusta, gera prejuízo e desafia academia e governos

Sargaço é um tipo de macroalga parda, que ocorre naturalmente no “Mar dos Sargaços”, próximo do Golfo do México e da Flórida


José Eduardo Martinelli Filho, João Adriano Rossignolo e Leonardo Capeleto de Andrade*, via Agência Bori | 06/04/2025 | 06:00


Registro de sargaço em Salinópolis (PA) em março de 2025; evento pode causar prejuízos para a pesca e o turismo | Foto: Geison Mesquita/Acervo pesquisadores

Após 10 anos, um evento extremo se repete na costa amazônica.  Não foi uma nova seca ou nem cheia extrema, como em anos anteriores, mas uma invasão alienígena: uma chegada massiva às praias de Sargassum – um tipo de macroalga pardaque ocorre naturalmente no “Mar dos Sargaços”, próximo do Golfo do México e da Flórida. Esse organismo foi reportado pela primeira vez por Cristóvão Colombo, em sua pioneira viagem às Américas. 

A primeira vez que os cientistas notaram que essas algas estavam sendo registradas longe do local original, inclusive no Brasil, foi em 2011. As pesquisas logo mostraram que o material vinha de uma nova origem, um “Novo Mar dos Sargaços“.

Em pequena quantidade, as algas não geram problemas significativos. As chegadas massivas (arribadas), porém, podem liberar gases tóxicos e malcheirosos em sua degradação (como sulfeto de hidrogênio, amônia e metano), afetando a qualidade do ar e da água, com o potencial aumento da acidificação e redução do oxigênio dissolvido, afetando peixes, corais e algas nativas. Além disso, metais tóxicos, como o arsênio, já foram registrados em grandes concentrações nesses organismos.

O temor é isso virar um “novo normal”. No Caribe a ocorrência do sargaço está gerando prejuízos bilionários para o turismo, por causa dos gastos com a limpeza das praias — que podem chegar a mais de US$ 1 milhão por quilômetro — , e cancelamentos de reservas, o que se notou até oito meses após os eventos. Já no Brasil, as chegadas nas praias ocorrem com uma frequência menor, porém sem um sistema de predição eficiente.

Sargassum pelágico (aquele que flutua) foi confirmado no país apenas em 2014 e 2015, em Salinópolis (PA) e no arquipélago de Fernando de Noronha, e em 2021 no litoral do Maranhão e em Pernambuco. Não há, até o momento, outros registros oficiais dessas espécies invasoras, apesar de relatos de outros sargaços serem comuns, o que sugere uma fragilidade de monitoramento.

Além disso, o Brasil ainda não possui estimativas oficiais para os custos com limpeza e perdas turísticas. E o impacto para pescadores artesanais, que sofrem com as redes entupidas e danificadas pelas algas (o que reduz a captura de peixes), ainda são pouco estudados. 

Existem mais de 300 espécies de Sargassum no mundo (fora outras popularmente chamadas de “sargaços”), sendo a maior parte bentônicas —vivendo associadas ao fundo do mar. Porém, as duas espécies que ocorrem no Mar dos Sargaços (S. natans e S. fluitans) são as únicas flutuantes sendo estas as causadoras dessas grandes arribadas, essas invasões exacerbadas.

Os motivos da grande proliferação das massas flutuantes no Atlântico envolvem uma soma de fatores, como o aquecimento das águas superficiais do oceano, mudanças em correntes marítimas, aumento na quantidade de nutrientes trazidos dos continentes e até mesmo de  tempestades de areia de origem subsaariana. Essas causas são incontroláveis, fazendo com que o problema do sargaço pelágico seja internacional e um dos mais complexos da oceanografia atual.

Apesar da falta de dados e desinformação na mídia sobre o assunto nos eventos anteriores, pesquisas vêm sendo desenvolvidas por universidades brasileiras, como a USP e a UFPA, com parcerias nacionais e internacionais para o aumento da preparação local para as arribadas de Sargassum na Amazônia

Precisamos nos preparar para eventos futuros, que lamentavelmente tendem a ocorrer, e antecipar as soluções para estes impactos negativos – talvez até os transformando em oportunidades. Com um monitoramento via satélite e drones para estimar os volumes, alertando e comunicando a população local, estas algas poderão ser em breve usadas de forma segura na construção civil agregando em adobe, tijolos, cimentos ou paineis.

 

(*) José Eduardo Martinelli Filho é professor associado no Instituto de Geociências da Universidade Federal do Pará, com experiência na área de Oceanografia Biológica, Ecologia Aquática, Ciências Ambientais e Impactos ambientais; João Adriano Rossignolo é professor do Departamento de Engenharia de Biossistemas da FZEA-USPLeonardo Capeleto de Andrade é pesquisador na área ambiental, atuando em temas de qualidade ambiental, poluição e divulgação científica


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