Testes com células CAR-T serão exclusivos para pacientes com leucemia linfoide aguda de células B e linfoma não-Hodgkin de células B que não responderam ou apresentaram o retorno da doença
Este dia 15 de março vai marcar o início do que pode ser uma revolução no tratamento de linfoma e leucemia na América Latina. Nessa data, o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) vai começar a incluir os candidatos ao estudo clínico de fases 1 e 2 do tratamento com células CAR-T.
O tratamento foi desenvolvido no Centro de Terapia Celular (CTC), um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) apoiado pela Fapesp no Hemocentro da FMRP-USP.
O tratamento é específico para pacientes com leucemia linfoide aguda de células B e linfoma não Hodgkin de células B que não responderam ou apresentaram o retorno da doença após a primeira linha de tratamento convencional, como quimioterapia e transplante de medula.
O início do estudo foi anunciado na quinta-feira (07/03) durante a Conferência Estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação (CECTI) e vai tratar 81 pacientes até o ano que vem (leia mais em: agencia.fapesp.br/51055/ e agencia.fapesp.br/49859).
“Inicialmente serão quatro pacientes tratados no Hospital das Clínicas da USP em Ribeirão Preto. Os dados serão então submetidos à Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária] para avaliação da segurança e, se tudo correr bem, os outros centros envolvidos no estudo poderão começar a tratar outros candidatos”, disse à Agência Fapesp Diego Clé, coordenador médico do Hemocentro de Ribeirão Preto.
Além do Hospital das Clínicas da FMRP-USP, participam do estudo o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP em São Paulo, o Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e os hospitais Beneficência Portuguesa e Sírio-Libanês, em São Paulo.
O tratamento com células CAR-T foi desenvolvido em 2017 nos Estados Unidos e, desde 2019, no Brasil, pela FMRP-USP, em colaboração com o Instituto Butantan e apoio da Fapesp.
A técnica consiste na retirada de linfócitos do próprio paciente, que são manipulados em laboratório e reaplicados no organismo. O objetivo é preparar os linfócitos para identificar e eliminar células tumorais que não foram detidas por outros tratamentos como quimioterapia e transplante de medula (leia mais em: agencia.fapesp.br/31656 e agencia.fapesp.br/38914).
O Hemocentro de Ribeirão Preto abriga a única fábrica de células CAR-T da América Latina, uma das poucas no mundo que não pertencem a grandes indústrias farmacêuticas. Até hoje, 20 pessoas foram tratadas com as células preparadas no Núcleo de Terapia Celular Avançada de Ribeirão Preto (Nutera-RP), um Centro de Ciência para o Desenvolvimento (CCD) da Fapesp. O núcleo pode preparar até 300 tratamentos por ano.
“Estima-se que de 3 mil a 4 mil pessoas poderiam se beneficiar desse tipo de tratamento hoje no Brasil. O Nutera-RP poderá aumentar a capacidade futuramente para dar conta da demanda, mas precisará de mais investimentos”, conta Clé.
Na iniciativa privada, o tratamento importado pode custar até R$ 2 milhões por paciente. O nacional, que pode ser adotado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), poderá sair por um sexto desse valor.
Pacientes
Os primeiros quatro pacientes tratados no Hospital das Clínicas da FMRP-USP terão uma pequena quantidade de sangue colhida, de onde os linfócitos T, um tipo de célula de defesa, serão isolados e modificados no Nutera-RP. Esse processo leva de 15 dias a um mês.
Depois de internados, os pacientes receberão então uma única infusão das próprias células, agora reprogramadas para atacar as células tumorais. Serão 15 dias de internação para acompanhar os possíveis efeitos colaterais, resultado da inflamação provocada pelo tratamento.
“A inflamação é um sinal de que o tratamento está fazendo efeito, mas pode causar desde sintomas leves, como febre e dor no corpo, até mesmo uma queda de pressão sanguínea e dificuldade respiratória, que pode ocorrer em 25% a 30% dos casos”, esclarece Clé.
Após a alta, o paciente seguirá sendo acompanhado em consultas semanais, até ter a primeira avaliação de eficácia do tratamento, após 30 dias da infusão. Os testes serão repetidos após 90 dias do início do tratamento. Todos os pacientes serão monitorados por cinco anos como parte do estudo.
“Esse é o primeiro e mais importante passo: mostrar que o tratamento é seguro e efetivo para ter a aprovação e poder ser disponibilizado tanto na rede pública quanto na privada”, encerra Clé.
Mais informações sobre o estudo podem ser obtidas clicando aqui.
(*) Com informações de Carlos Fioravanti, da Revista Pesquisa Fapesp
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